Liberalismo e fundamentalismo teológico

Teólogo brasileiro respeitado e reconhecido por sua sólida contribuição acadêmica, Augustus Nicodemus é professor visitante de Novo Testamento no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (CPAJ), da Universidade Mackenzie. Doutorou-se em Hermenêutica e Estudos Bíblicos (Ph.D., NT) no Westminster Theological Seminary (1993). É Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie e pastor auxiliar da Igreja Presbiteriana de Santo Amaro (S). E, também, autor de vários livros, entre eles: Calvino, o teólogo do Espírito Santo (1996), O que você precisa saber sobre batalha espiritual (1997), Calvino e a responsabilidade social da Igreja (1997), A Bíblia e a sua família (2001), O culto espiritual (2001) e A Bíblia e seus intérpretes (2004), além de diversos artigos acadêmicos. Na entrevista que segue, ele nos fala um pouco sobre assuntos que têm provocado polêmica entre os teólogos evangélicos: o liberalismo e o fundamentalismo teológico.

Defesa da Fé – O liberalismo teológico não surgiu do nada. Quais foram os acontecimentos históricos que preparam o caminho para o seu surgimento?

Profº NicodemusO liberalismo é, de muitas maneiras, um fruto do Iluminismo, movimento surgido no início do século 18 que tinha em seu âmago uma revolta contra o poder da religião institucionalizada e contra a religião em geral. As pressuposições filosóficas do movimento eram, em primeiro lugar, o Racionalismo de Descartes, Spinoza e Leibniz, e o Empirismo de Locke, Berkeley e Hume. Os efeitos combinados dessas duas filosofias — que, mesmo sendo teoricamente contrárias entre si, concordavam que Deus tem de ficar de fora do conhecimento humano — produziu profundo impacto na teologia cristã. Como resultado da invasão do Racionalismo na teologia, chegou-se à conclusão de que o “sobrenatural não invade a história”. A história passou a ser vista como simplesmente uma relação natural de causas e efeitos. O conceito de que Deus se revela ao homem e de que intervém e atua na história humana foram logo excluídos. A fé cristã histórica sempre acreditou que os milagres bíblicos realmente ocorreram como narrados. Milagres como o nascimento virginal de Cristo, os milagres que o próprio Cristo realizou, sua ressurreição física dentre os mortos, os milagres do Antigo e Novo Testamentos, de maneira geral, são todos considerados fatos. O teólogo liberal, por sua vez, e os neo-ortodoxos fazem distinção entre historie (história, fatos brutos) e heilsgeschichte (história santa, ou história salvífica), criando dois mundos distintos e não conectados: o mundo da história bruta, real, factível e o mundo da fé, da história da salvação. Temas como criação, Adão, queda, milagres, ressurreição, entre outros, pertencem à história salvífica e não à história real e bruta. Para os liberais e os neo-ortodoxos, não interessa o que realmente aconteceu no túmulo de Jesus no primeiro dia da semana, mas, sim, a declaração dos discípulos de Jesus que diz que Jesus ressuscitou. Assim, o que eles querem afirmar com isso é bastante diferente daquilo que a fé cristã histórica acredita. Na verdade, eles consideram que os relatos bíblicos dos milagres são invenções piedosas do povo judeu e dos primeiros cristãos, mitos e lendas oriundos de uma época pré-científica, quando ainda não havia explicação racional e lógica para o sobrenatural

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